The next big thing? Or the last big thing? – Camilo Lourenço

The next big thing? Or the last big thing? – Camilo Lourenço

Um dos conceitos mais importantes que se aprende nas escolas de Gestão é a necessidade de as empresas estarem permanentemente atentas às tendências do mercado: “O que está a dar” ou, mais importante ainda, “O que vai dar”.

Anteciparmo-nos ao mercado é seguramente uma das formas mais seguras de as nossas empresas não se tornarem obsoletas e, com isso, sermos varridos do mercado (quantas marcas conhece que, tendo nascido no século XIX, sobreviveram até aos nossos dias?). Mas, às vezes, a procura constante da novidade tem um efeito contraproducente: descartar áreas de negócio que perduram no tempo. 

Vamos a um exemplo do dia-a-dia. Se o leitor tem mais de 20 anos, lembra-se dos CD, que vieram substituir os discos de vinil (que perdura nas memórias dos maiores de 35). Ainda me lembro de ouvir discussões acesas sobre como o CD ia dar cabo do vinil e de como se tornaria na norma dominante da música nas próximas décadas. Afinal, não foi bem assim: o CD passou para o baú das recordações e já não faz aparições regulares na sala de estar dos lares modernos. Foi substituído pelos ficheiros digitalizados. Que, por sua vez, estão a ser desafiados por nova tecnologia: o streaming de música (ver o crescimento do Spotify).

Esta evolução parece dar razão à primeira parte do título deste artigo: o futuro é mesmo a procura da “next big thing”. E os factos comprovam-no: a Apple, criadora da música digitalizada (v.g. o sucesso do iPod que antecipou a revolução dos smarthphones como music players), foi apanhada na contra-curva pelo crescimento do spotify (que já tem 15 milhões de utilizadores – números de 2014). E de tal forma que, para responder a esta disrupção do mercado (evolução dos ficheiros digitalizados para o streaming), foi obrigada a comprar “time do market”: adquiriu a Beat, concorrente da Spotify, por uns astronómicos 3 mil milhões de dólares. 

Mas será mesmo assim? Só sobrevive quem procura a “next big thing”? Não. E, para fundamentar esta afirmação, não é preciso sair do mundo da música: as empresas que produzem discos de vinil, o tal que deveria ter desaparecido do mercado nos anos 80, não têm mãos a medir. No ano passado, venderam-se, só no mercado inglês, 1,7 milhões de discos, prevendo-se que este valor ultrapasse os 2 milhões em 2015. Em 2010, há escassos cinco anos, as vendas pouco passavam das 200 mil unidades e o mercado valia cerca de 3,4 milhões de libras, por oposição aos 26 milhões do ano passado…

Ok, a esta hora o leitor está a dizer: “Mas são os nostálgicos dos anos 70, os amantes da memorabilia, que sustentam este mercado”. Os factos, aparentemente, dão-lhe razão: o álbum mais vendido em 2014 foi “Physical Graffity”, dos Led Zepellin, uma relíquia dos anos 70. Not so fast: o outro disco mais vendido foi “Chasing Yesterday”, dos High Flying Birds, banda criada em 2010 por Noel Gallagher, depois deste abandonar os “Oasis”. Bum! Lá se vai a teoria da memorabilia… Mais: na lista de top-sellers está também “AM”, dos Artic Monkeys (se não conhece, pergunte por eles aos seus filhos…). 

Os números, e a tendência, sugerem que não é apenas a nostalgia que leva um número crescente de consumidores a comprar vinil. Até porque os “gira-discos”, onde estas supostas peças de museu são ouvidos, em nada se assemelham ao conjunto prato-conta-rotações (33-45-78), cujo braço-com-agulha-de-diamante, cuidadosamente, levantávamos nos anos 70 para colocar em cima do disco. São autênticos prodígios de tecnologia que custam centenas ou mesmo milhares de euros…

É provável que os inquéritos feitos a estes neófitos do vinil, de que é a qualidade de som e a informação (em estilo “libreto”) que os motiva, tenham alguma ponta de verdade.

Onde é que tudo isto nos deixa? Na interessante dúvida de saber se compensa mesmo estarmos sempre à procura da “next big thing”, sabendo que os números sugerem que há dinheiro para fazer na “last big thing”. Uma coisa não preclude a outra. Os números mostram que o mercado de música digital+streaming vale mais de 6 mil milhões de euros, uma diferença brutal face ao mercado de vinil. Mas a verdade é que há empresas a viver neste nicho… em crescimento. E ganham dinheiro.

 


Camilo-Lourenço-FotoNova-coluna-1Camilo Lourenço é licenciado em Direito Económico pela Universidade de Lisboa. Passou ainda pela Universidade de Columbia, em Nova Iorque e University of Michigan, onde fez uma especialização em jornalismo financeiro. Passou também pela Universidade Católica Portuguesa. Comentador de assuntos económicos e financeiros em vários canais de televisão generalista, é também docente universitário. Em 2010, por solicitação de várias entidades (portuguesas e multinacionais), começou a fazer palestras de formação, dirigidas aos quadros médios e superiores, em áreas como Liderança, Marketing e Gestão. Em 2007 estreou-se na escrita, sendo o seu livro mais recente “Saiam da Frente!”, sobre os protagonistas das três bancarrotas sofridas por Portugal que continuam no poder.