A liderança no futebol é uma liderança… de marca – Camilo Lourenço

A liderança no futebol é uma liderança… de marca – Camilo Lourenço

Os leitores que me desculpem, mas vou voltar ao futebol. Não, não é por ser fanático do desporto. É porque é a área onde, nos dias de hoje, se podem encontrar grandes lições de Gestão e de Liderança.

Na semana passada, falámos do efeito Marco Silva na vitória do Sporting na Taça de Portugal; esta semana vamos falar do ranking das marcas de futebol mais valiosas do mundo. Rankings há muitos; e até se pode dizer que os há para todos os gostos. Coisa que permite as interpretações mais diversas. Como naquelas análises na noite das eleições, em que toda a gente ganha. Mesmo quando perde…

Mas voltemos ao futebol. Há semanas, a empresa Brand Finance divulgava um ranking das marcas mais valiosas do futebol mundial. Primeira curiosidade: nos dez primeiros lugares, aparecem seis clubes ingleses. Segunda curiosidade: o Manchester United, que tem andado ausente dos grandes palcos mundiais, surge em primeiro lugar. Mais: entre 2014 e 2015 o valor da marca Manchester valorizou-se… 63%.

A primeira tentação é questionar o resultado: como explicar que uma equipa que não ganha nada, interna e externamente, há dois anos surge no topo? E como explicar a queda do Barça que, não obstante ter ganho a Champions League, este ano cai dois lugares? E, já agora, o que justifica a queda do Real Madrid, de segundo para terceiro lugar, se ganhou no ano passado a mesma Champions League? 

Dir-se-ia que o ranking não tem pés nem cabeça. Talvez não seja bem assim. E, para percebermos isso, temos de atentar no pormenor de haver seis marcas inglesas no top ten. Porquê? Em minha opinião, isso acontece por duas razões: 
1 – Os clubes ingleses foram os primeiros a perceber que o negócio do futebol… não é um negócio de futebol; é um negócio de marcas. 

2 – Os clubes ingleses foram os primeiros a eleger os mercados externos como arma para o seu crescimento. Mesmo antes do Real Madrid, que (só) chegou à mesma conclusão com a primeira vitória de Florentino Perez, no início da década passada.

Foi essa aposta dos clubes ingleses em mercados emergentes, como a China, a Índia e o sudeste asiático em geral, que lhes deu um avanço difícil de combater pelos clubes de ligas igualmente ricas, como a italiana (não coloca nenhum clube no top ten), a alemã (o Bayern subiu ao segundo lugar por troca com o Real Madrid) e mesmo a espanhola.

A vitória do Barça este ano e o facto de ter chegado às meias-finais no ano passado não conta nada? E a vitória do Real, também no ano passado, não se devia ter refletido no ranking agora divulgado pela Brand Finance? Não. Porque isto é um jogo de longo prazo. Ou seja, é provável que, daqui a dois ou três anos, estas vitórias se traduzam numa apreciação do valor da marca Real e Barça. De que forma? No aumento do valor dos negócios que fazem para além da bilheteira: valor dos direitos de transmissões televisivas, valor dos patrocínios, etc. Veja-se como o Manchester, apesar da “secura” ganhadora dos últimos dois anos, fez recentemente negócios bilionários com a Adidas e com a Chevrolet: isso só aconteceu porque duas empresas acharam que vale a pena pagar fortunas para pôr o nome nas camisolas (Chevrolet) e associar o nome de uma marca desportiva (Adidas) ao do clube. A pensar em Inglaterra? Não. A pensar na imensa role de pessoas que vivem na Índia e na China (mais de 40% da população mundial).

Só que, para cair no radar destas marcas e para melhorar o valor dos direitos de transmissão televisiva, é preciso ter uma estratégia de longo prazo. Ou seja, quem dirigiu os clubes ingleses percebeu, muito antes dos seus congéneres continentais, que a Liderança do futebol se jogava no valor da marca… e não no futebol propriamente dito. E os resultados estão à vista.

 


Camilo-Lourenço-FotoNovaCamilo Lourenço é licenciado em Direito Económico pela Universidade de Lisboa. Passou ainda pela Universidade de Columbia, em Nova Iorque e University of Michigan, onde fez uma especialização em jornalismo financeiro. Passou também pela Universidade Católica Portuguesa. Comentador de assuntos económicos e financeiros em vários canais de televisão generalista, é também docente universitário. Em 2010, por solicitação de várias entidades (portuguesas e multinacionais), começou a fazer palestras de formação, dirigidas aos quadros médios e superiores, em áreas como Liderança, Marketing e Gestão. Em 2007 estreou-se na escrita, sendo o seu livro mais recente “Saiam da Frente!”, sobre os protagonistas das três bancarrotas sofridas por Portugal que continuam no poder.