Porto, a cidade, e a Lionesa, a moderna e atarefada comunidade de trabalhadores, estão a receber reservas para pessoas, start-ups e companhias prontas para prosperar, criar e trabalhar no centro do futuro.
Jonathan Littman e Susanna Camp
Estamos num agradável e arejado pátio, do comprimento de uma estação de comboios de carga, um espaço colossal no entanto quase intimista, repleto de mesas e de cadeiras coloridas ocupadas por Millennials internacionais a ler, em grupos a conversar ou a fumar, na sua pausa para almoço, à porta de restaurantes na moda e de escritórios modernos. A nossa anfitriã, Eduarda Pinto, é diretora executiva da Lionesa (em Leça do Balio), um novo tipo de hub de negócios e comunidade que anuncia uma transformação global essencial. Connosco está Alexandre Santos, diretor de desenvolvimento de portefólio num importante fundo europeu de capital de risco. Ele explica de bom grado o que é óbvio à nossa volta – porque teve de se estabelecer aqui. Não é só a boa vida. É o bom trabalho. Alguns milhares de pessoas trabalham no Centro Empresarial Lionesa, numa centena de empresas de todas as formas, sabores e tamanhos. Este é o local onde estar em Portugal, se não na Europa. Trata-se do conhecimento humano pulsante do amanhã.
A força de trabalho do futuro vai desempenhar as suas funções em destinos de ponta humanistas. A atratividade da Lionesa vai muito além do espaço cool. Trata-se de aproveitar o abundante e espontâneo potencial de polinização cruzada e de colaboração que emerge quando se traz para o mix empresas internacionais muito interessantes. E não se restringe apenas ao inquilino-âncora e unicórnio português Farfetch, a plataforma de comércio online de marcas de luxo que tem 1.000 funcionários no local. Abrange uma dúzia de outras empresas internacionais de grande dimensão com numerosas equipas locais, que vão da dinamarquesa Vestas (líder mundial na produção de turbinas eólicas) à Hilti (gigante multinacional baseada no Liechtenstein que produz ferramentas para a construção, e considerada o melhor lugar para trabalhar em Portugal nos últimos três anos), passando pela empresa chinesa de trading Li & Fung. A Lionesa está ocupada na totalidade e a aceitar reservas para uma vasta expansão. Mais que um developer moderno, a equipa vê-se como uma forma de combinar talento e recursos na sua rede em expansão. “Somos superconectores. Passamos muito tempo a juntar pessoas”, diz-nos Eduarda Pinto.
Em São Francisco (EUA), as discussões sobre o futuro do trabalho podem ser pessimistas: menos sobre pessoas e cultura e mais sobre o pavor de que a inteligência artificial e a economia gig [ocupações temporárias e sem vínculo] dizimem o mercado de trabalho. no Porto, uma cidade muitas vezes ofuscada pela glamourosa Lisboa, encontrámos um modelo esperançoso, menos distorcido pela tecnologia. O espaço, situado numa antiga e extensa fábrica de tecidos em seda – a Lionesa, entretanto renovada, dança facilmente com o que o rodeia e com o seu passado, entretecendo arte, cultura e modernidade. No outro lado da rua, as escadas da vizinha e parceira Super Bock; e apenas 50 metros à frente está o Mosteiro de Leça do Balio, património do séc. XII restaurado pelo Centro Empresarial Lionesa.
Ao todo, são sete edifícios principais, 37 mil metros quadrados de escritórios, número que mais que duplicará em alguns anos com a planeada expansão. A entrada principal é ao mesmo tempo urbana e digna da ópera, em que a massiva parede – com murais de vários artistas de rua internacionalmente reconhecidos – celebra a orgulhosa cultura local histórica e contemporânea. A mistura do layout interior-exterior e decoração atraente criam um ambiente interessante. “Queremos construir uma comunidade e criar um sentimento de pertença”, diz Matilde Barroso, diretora de marketing da Lionesa. “Porque sabemos que faz realmente a diferença. Costumamos dizer que não temos 100 inquilinos, temos 5.600 amigos. Se eles estão felizes as suas empresas estão felizes, e todos estão felizes”, acrescenta.
A Lionesa é um exemplo convincente de um local com história reinventado que antecipa as mudanças de sensibilidade e as interações de colaboração que estão a impulsionar a inovação global. A diversidade é revigorante, e aqui a diversidade inclui não só o espaço e a variedade de negócios, mas também as 25 nacionalidades representadas nos milhares de trabalhadores. Por comparação com os EUA, onde – apesar de uma recente mudança sísmica em direção ao empreendedorismo e às start-ups e de alguns retoques ornamentais chamativos – a maioria dos locais de trabalho ainda ecoa a aparência homogénea de subúrbio dos anos de 1980. Os locais de trabalho nos EUA continuam dominados por mega empregadores únicos – basta pensar no campus do Facebook, no Infinite Loop da Apple, no Google Ring – ou por edifícios de escritórios suburbanos monótonos e isolados, onde as empresas são segregadas por fração e andar.
Em contraste, os inquilinos da Lionesa tocam uma espécie de jazz de trabalho: um conjunto de start-ups, scale-ups e outposts (representações) para empresas estabelecidas, acompanhado por fornecedores de serviços criativos, hair stylists, personal trainers, cinco restaurantes, um ginásio e instalações de arte rotativas. O amplo espectro de empresas é ideal. “Não queremos ser apenas um campus de start-ups”, explica Eduarda Pinto. “É simpático para os empresários, porque podem encontrar-se todos; podem conversar ao almoço com os CEO das grandes empresas. E isto pode ser uma mais-valia para as companhias que aqui estão, que muitas vezes têm start-ups a nível interno, para desenvolver inovação”.
O legado do Porto na indústria e no conhecimento
Em muitos aspetos a Lionesa tem uma dívida para com as antigas e profundas fundações técnicas e industriais do Porto. O UPTEC - Parque de Ciência e Tecnologia da Universidade do Porto, liderado pela diretora executiva Clara Gonçalves, é uma enorme e ousada universidade apoiada por fundos europeus que gerou dezenas de start-ups de sucesso, e registou cerca de 154 milhões de euros em receitas em 2017. As raízes vão ainda mais lá atrás. A ANJE - Associação Nacional de Jovens Empresários, começou a cultivar talento em 1982, e tem um historial de conversão de start-ups baseadas no conhecimento em oportunidades de mercado, e de facilitar a sua ligação a capital de risco.
Para percebermos mais sobre estas iniciativas nortenhas, André Forte, media relations da StartUp Portugal (fundadora fundamental do movimento nacional em direção ao empreendedorismo), apresenta-nos Daniela Monteiro, diretora de empreendedorismo e desenvolvimento de ecossistemas na Porto Digital. “É um ecossistema diferente de Lisboa. A economia no Norte tem estado historicamente ligada à produção: têxteis, móveis, cortiça, sapatos…”, enumera Daniela Monteiro durante o almoço na Baixa do Porto. “E depois, temos também uma maior ligação com as empresas baseadas no conhecimento. As novas empresas estão mais ligadas às universidades”.
Pode haver outra diferença. Enquanto a região de produção à volta do Porto é extensa e se estende para incluir várias universidades de ponta, o centro da cidade em si é consideravelmente menor que o de Lisboa, tornando mais fácil o contacto entre os intervenientes. A Porto Digital está a liderar muitos projetos locais de cidades inteligentes (smart cities), mas está também a impulsionar a inovação e o empreendedorismo. “Um dos nossos projetos de empreendedorismo é o ScaleUp Porto”, explica Daniela Monteiro. “Para o presidente da Câmara, fez parte do seu programa eleitoral desde o início, e porque a inovação e o empreendedorismo são realmente importantes para nós, fazem parte do ADN da cidade.”
Um novo empreendimento na Lionesa liderado por Alexandre Santos é um bom exemplo. Quando um amigo lhe disse o ano passado que Eduarda Pinto estava a pensar em fazer algo em termos de empreendedorismo, os dois encontraram-se, a ideia foi trabalhada e ganhou forma. Alexandre Santos afirma que “detetámos a necessidade de um novo espaço e de uma abordagem diferente ao empreendedorismo”. Eduarda Pinto adianta que “sentimos que havia uma necessidade subjacente de espaço para empreendedores e empresas. Onde eles pudessem encontrar-se de modo mais aberto e partilhar. Apercebemo-nos de que precisamos realmente de ter empreendedores numa fase mais inicial”.
Os brilhantes empreendedores da Bright Pixel
Estes insights levaram a uma parceria com o laboratório para criação de empresas de Alexandre Santos – a BrightPixel Capital, com a Porto Business School, a Beta-i, e a Chain Reaction, para lançar o Reactor Innovation Hub, à entrada da Lionesa. O acelerador Reactor personifica a abertura da Lionesa ao patrocinar eventos para a comunidade em geral, como pitches para as start-ups, e palestras para as grandes empresas. Alexandre Santos tem aqui um escritório e vê o Reactor como um excelente modelo para o novo papel a desempenhar pelo Porto. “Posso partilhar a minha visão, fazer o meu mentorship/orientação e começar a trazer alguns dos meus investimentos”, afirma, acrescentando que é altura de o Porto assumir a sua merecida posição na nova economia. “A maioria dos empreendedores em Portugal vem do Norte”.
É por isso que a Lionesa, muito à frente, é só um dos excelentes lugares para experimentar o futuro do trabalho no Porto. Em breve partilharemos outra história sobre o UPTEC, a ANJE e a Founders Founders, onde encontramos uma cultura repleta de energia e de entusiasmo que impulsiona um grande movimento em start-ups e scale-ups a norte de Lisboa.
O Porto está a maturar não só enquanto cidade mas enquanto ecossistema tecnológico globalmente conectado. E a Lionesa simboliza esta nova e ampla ambição. A construção arranca no final deste ano com uma expansão no valor de 100 milhões de euros liderada pelo arquiteto António Leitão Barbosa, e que vai aumentar a população de inquilinos para 10.000, com uma torre de escritórios e um espaçoso hotel de negócios, todos interligados por um vai-e-vem suspenso por carril projetado especificamente para esta colmeia digital.
Porto, a cidade, e a Lionesa, a moderna e atarefada comunidade de trabalhadores, estão a receber reservas para pessoas, start-ups e companhias prontas para prosperar, criar e trabalhar no hub do futuro.
23-05-2018
Portal da Liderança
Nota: Tradução do artigo de Jonathan Littman e Susanna Camp, originalmente publicado no hub de inovação SmartUp.life, que reúne textos sobre empreendedorismo e inovação, incluindo este sobre Lisboa, ou ainda este.