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Realismo, resiliência, empatia e criatividade são outras caraterísticas de um líder, diz António Simões, vice-presidente executivo da Nutrinveste, vencedor da categoria de internacionalização, dos Best Leader Awards 2013, atribuídos pela Leadership Business Consulting e o SOL. Pensar global e agir local." Quais os pontos fortes que um bom líder em internacionalização deve potenciar? A ambição de crescimento implica, necessariamente, abraçar novos desafios inerentes a novos mercados, novos clientes e novos consumidores, com culturas, hábitos e enquadramentos diferentes daqueles que estamos habituados a gerir. Assim, a internacionalização acaba por ser não verdadeiramente uma opção, mas mais uma necessidade... É importante garantir que esta visão é partilhada pela organização e ter a humildade de perceber as realidades locais, sem a veleidade de adotar em todos os mercados as mesmas receitas, apenas porque tiveram êxito noutras partes do globo... É uma forma de estar global, ou seja, pensar global e agir local. E os pontos fracos proibitivos? Internacionalizar só por internacionalizar. As ideias pré-concebidas sobre mercados que não conhecemos em detalhe. O não fazer o trabalho de casa. Não garantir de que se dispõe de todos os meios, humanos e financeiros para o fazer. A incapacidade de adaptação. Falta de resiliência. E, sendo necessária alguma dose de loucura, não exagerar... Qual foi a maior conquista da Sovena sob o seu comando? O grande desenvolvimento da Sovena, e em particular, o crescimento internacional, deu-se nos últimos dez anos. É com orgulho que, recuando apenas pouco mais de uma década, verificamos que passámos de um grupo que tinha cerca de 80% das vendas em Portugal para a situação atual, em que vendemos cerca de 80% fora do País. Foi seguramente fundamental para o grupo a aquisição, em 2002, dos ativos da hoje Sovena Espanha (Sevilha) ou a aquisição, em 2005, da empresa que viria a dar origem à Sovena USA. Assim como a aposta, a partir de 2007, na plantação e exploração de olivais, principalmente em Portugal, mas também em Espanha e em Marrocos, isto só para citar algumas das inúmeras operações concretizadas. A maior conquista que a equipa da Sovena conseguiu foi, seguramente, este crescimento contínuo e sustentado e o reconhecimento da sua importância num setor dominado por empresas italianas e espanholas. E o maior risco? Um dos maiores riscos poderá ter sido a opção da Nutrinveste de abdicar de todos os outros negócios e centrar os recursos na Sovena como veículo para o seu desenvolvimento futuro, particularmente centrado na internacionalização. Existia a perceção de que estávamos a apostar na área de negócio com maiores potencialidades de crescimento a nível internacional, principalmente através do negócio de azeite e, de facto, veio a revelar-se uma aposta correta. A Nutrinveste está muito ligada ao sector agrícola. Como analisa esta tendência recente de se voltar a apostar na agricultura? Através da Sovena, temos uma integração relevante em toda a cadeia de valor do negócio do azeite. E é inegável que as fases a montante na cadeia produtiva, neste caso em particular a plantação e exploração de olival, têm vindo a assumir uma ponderação relevante na partilha de valor acrescentado. Acima de tudo, permitem garantir uma qualidade e traceabilidade acrescidas, substituir importações e uma maior diferenciação e flexibilidade na oferta final. Pode ser uma alternativa para os jovens conseguirem ter emprego e uma carreira, por exemplo? Sim, desde que abordada de uma forma profissional. A agricultura moderna não é mais uma agricultura de subsistência, e poderá seguramente contribuir para o desenvolvimento de uma carreira exigente mas recompensadora. A Sovena, detida pela Nutrinveste, assume-se como segundo maior player do mundo na sua área de negócio. E está em mais de 70 países. Qual o papel do líder na gestão desta diversidade cultural, em cenários económicos tão diversificados? Em primeiro lugar, ter a humildade de perceber as realidades locais sem ter pretensões de, à partida, conhecer os diferentes enquadramentos ou a veleidade de adotar as mesmas receitas e procedimentos, apenas porque demonstraram ter êxito noutras partes do globo. É importante garantir que esta visão é partilhada pela organização e que as ações do dia-a-dia, desde as áreas mais estratégicas às mais operacionais, não são incompatíveis com este rumo, mas pelo contrário contribuem de modo decisivo para o mesmo objetivo. Que maiores dificuldades apontaria a esse processo de liderar uma empresa com este nível de internacionalização? Provavelmente gerir pessoas diferentes, com culturas diferentes e em enquadramentos diferentes, mantendo as especificidades de cada mercado, mas simultaneamente o ativo que consideramos serem os nossos valores e a nossa especificidade enquanto grupo. Como consegue pôr equipas de várias nacionalidades a falar “a uma só voz” quanto ao rumo da empresa? Se o rumo e as principais opções estratégicas e operacionais estiverem claras e interiorizadas por todos, a consequência acaba por ser uma organização “naturalmente” alinhada. Tendo, equipas de coordenação funcional horizontais com um bom conhecimento de negócio global, combinadas com o conhecimento local. E com muita comunicação. Enquanto líder, como interpreta a atual liderança política europeia? Penso que até determinada altura pecaram por omissão, da mesma forma que agora pecam por excesso de intromissão. O laxismo no controlo das contas públicas e da dívida soberana primeiro, a gestão inadequada da crise financeira internacional e a dificuldade em criar confiança e esperança num futuro diferente são constrangimentos que estrangulam e dificultam a estratégia de qualquer empresa. E a portuguesa? Há algum crash course que aconselharia? O deficit, a dívida pública e a carga fiscal criaram uma espiral recessiva que, associada aos outros custos de contexto, tornaram a vida das empresas em Portugal um verdadeiro inferno. E na verdade não estamos a conseguir quebrar este ciclo vicioso. De que forma as empresas portuguesas no exterior estão a contribuir para a imagem do País junto dos mercados? De uma forma muito positiva. Há projetos claramente inovadores e diferenciadores em várias geografias que constituem um cartão de visita para o que se pode fazer de bom em Portugal. Também há portugueses que ocupam lugares de relevo a nível internacional e que representam um incentivo e um exemplo para todos nós. Quais os obstáculos que esta crise coloca aos atuais líderes empresariais? A estagnação/recessão nos mercados tradicionais (Portugal, Espanha e outros países da Europa) obriga a, de uma forma apressada, encontrar mercados alternativos em geografias com regras e culturas distintas e com exigências de competitividade e conhecimento para os quais algumas empresas não estão preparadas. Os custos energéticos, ainda alguma rigidez na mão de obra, os designados custos de contexto, o custo de financiamento e a elevada carga fiscal são muitas vezes barreiras intransponíveis para muitos projetos. Como se mantém a moral/ânimo de colaboradores em organizações que estão a fazer downsizing? A Sovena, pela sua dinâmica de crescimento, não se tem visto confrontada com situações de downsizing, apenas com ajustes pontuais de equipas às exigências de cada momento. Mas a objetividade na comunicação e a disponibilidade para encontrar com cada pessoa uma solução para o seu futuro são aspetos críticos para minimizar o impacto nos funcionários abrangidos e dar confiança aos que ficam na organização. Quais as grandes dificuldades que o seu setor enfrenta, a curto e a médio prazo? Desde logo uma dependência muito grande do preço das matérias-primas, que podem representar, em algumas circunstâncias, entre 60 e 90% do preço de venda dos produtos. E a força e capacidade negocial dos clientes, distribuição moderna e grandes operadores horeca. E oportunidades? Consolidar nos mercados tradicionais (Portugal, Espanha e outros países da Europa); aproveitar as oportunidades em mercados novos (Brasil, EUA, China, Rússia, Médio Oriente e África) por crescimento orgânico ou aquisições; continuar a integração na cadeia de valor com origenação de mais semente de girassol e plantações de olival em Portugal, Espanha, Marrocos e novos países produtores como o Chile, os EUA e a Argentina. E, se possível, participar ativamente na consolidação do setor. Numa Europa em crise, para que mercados devem olhar os empresários portugueses e como devem fazê-lo? Devem olhar para mercados que possuam o potencial de crescimento que escasseia no mercado europeu. A nossa perspetiva tem sido olhar para os mercados novos primeiro numa lógica de exportação, geridos mais a partir de Portugal ou mais localmente em função da sua importância e quando se justifica deslocalizar e/ou comprar operações locais que permitam um crescimento mais rápido. Assim fizemos em 2001 com Espanha, hoje o primeiro mercado da Sovena; em 2004 com o Brasil comprando uma marca portuguesa com presença naquele país e em 2005 com os Estados Unidos que hoje representam quase 20% das vendas do grupo. É exatamente desta forma que estamos a pensar a nossa estratégia na América Latina, nos países de leste, na Rússia em particular, e na Ásia e Pacífico, sobretudo na China. Como define o seu estilo de liderança? A liderança depende muito da capacidade de formar equipas, de as envolver na definição da estratégia e na execução dos planos de ação. Na Sovena temos uma boa equipa. A liderança, nos tempos que correm, exige realismo, resiliência, empatia, criatividade e alguma dose de loucura. Na Sovena temos um pouco disto tudo. Como podem melhorar os líderes portugueses? Temos exemplos excelentes de liderança em Portugal e de empresas que conseguiram replicar o seu modelo de negócio fora de Portugal. Essa parece-me ser a chave de sucesso de uma boa liderança no futuro. Um mercado de 10 milhões de pessoas e/ou consumidores, aberto pelos efeitos da globalização, só em determinadas circunstâncias permitirá a criação de valor de uma forma sustentada para garantir a perenidade de um negócio.
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