António Fernandes: O maior desafio do NOSi é penetrar no e-gov de outros países da sub-região

António Fernandes: O maior desafio do NOSi é penetrar no e-gov de outros países da sub-região
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O CEO do NOSi - Núcleo Operacional da Sociedade de Informação de Cabo Verde, falou com o Portal da Liderança sobre os grandes desafios que a entidade tem pela frente. António Fernandes aborda, em entrevista, questões como a dependência tecnológica, a transformação de uma estrutura orgânica do Governo numa entidade pública empresarial, ou a capacitação dos Recursos Humanos. O professor e ex-ministro adianta que, a médio prazo, “o maior desafio é penetrar no mercado da governação eletrónica de outros países da sub-região”. Para tal contribui a aposta constante na inovação “em diversos níveis de serviços que presta”, de que é exemplo o IGRP - Integrated Government Resource Planning, uma plataforma proprietária desenvolvida pelo NOSi para desenvolver software de governação eletrónica através de um gerador de código. O IGRP “é tão eficaz que hoje é usado no NOSi quase exclusivamente para o desenvolvimento de software de governação eletrónica, sendo também usado por alguns países da CPLP - Comunidade dos Países de Língua Portuguesa, sob licença”, explica o engenheiro de formação.

Criado em 2003, o NOSi tem vindo a contribuir para a modernização do aparelho do Estado de Cabo Verde e para a dinamização da sociedade civil na área da informação e do conhecimento. Como é o caso da assinatura, a 17 de abril, de um memorando de cooperação com a Huawei Technologies (empresa chinesa de equipamentos para redes e telecomunicações) em que as duas partes se comprometem a trabalhar em conjunto na área das TIC, bem como a estabelecer uma parceria estratégica, em que a Huawei vai cooperar com o NOSi na governação eletrónica (permitindo desenvolver e implantar soluções end-to-end na educação, saúde e segurança social, governação local, gestão de terra, desmaterialização de registos, identificação e autenticação de pessoas e documentos).

Quais os principais serviços/produtos do NOSi?
O NOSi produz software para a governação eletrónica, disponibiliza infraestruturas de TIC que suportam essa oferta, disponibiliza espaço de colocação de infraestruturas num centro de dados e garante o funcionamento de uma rede de telecomunicações privativa do Estado.

Nas vertentes de atuação do NOSi, qual (ou quais) a prioritária, tendo em conta as necessidades de Cabo Verde?
O core business do NOSi é a governação eletrónica. Os outros produtos são complementares e fazem parte da oferta do NOSi porque não existe ainda no mercado uma oferta confiável de plataformas e sistemas ou colocação de infraestruturas que possam ser usadas para que o NOSi possa oferecer um produto SaaS – Software as a Service. 

"A visão do NOSi é constituir-se um motor confiável de transformação para uma sociedade digital"


Quando assumiu funções, em junho de 2016, declarou que a sua equipa iria “trabalhar para que o NOSi se torne num centro de referência em África” – em que medida?

É sempre bom estabelecer objetivos de longo prazo. A visão do NOSi é constituir-se um “motor confiável de transformação para uma sociedade digital”. O desenvolvimento de ferramentas da governação eletrónica com uma estratégia de integração e interoperabilidade irá ter impacto direto na forma como a administração pública presta serviço aos cidadãos, mas irá também favorecer a integração de dados com qualquer outra entidade, seja pública ou privada, melhorando o ambiente de negócios e da economia digital.

Quais as iniciativas que estão a ser realizadas nesse sentido?
A principal iniciativa é enquadrada pelo projeto Opendata.cv, onde se pretende, até final de 2017, expor diretamente na internet toda a filosofia de integração de dados subjacente ao trabalho que o NOSi tem desenvolvido, disponibilizando dados que as instituições “donas” queiram facultar de forma aberta e facilitar a transação de dados que não podem por lei ser abertos.
Outra iniciativa do NOSi consiste em estabelecer uma forma colaborativa de desenvolvimento de software no domínio da governação eletrónica, no Nosicode.cv. O desenvolvimento e consolidação das infraestruturas de suporte do negócio e-gov, e mais geralmente da economia digital, também acaba por ser uma área de intervenção do NOSi. Neste sentido, o NOSi tem dado uma contribuição importante para a reformulação do modelo de instalação e gestão de uma rede de comunicações eletrónicas sólida, robusta, ramificada e conectada diretamente ao backbone da internet, que todos os agentes produtivos poderão beneficiar para o desenvolvimento da economia digital.

Quais são os grandes objetivos da entidade a curto e médio prazo?
Dois grandes desafios do NOSi a curto prazo são melhorar os seus produtos e serviços trazendo uma maior satisfação aos clientes, e tornar-se sustentável.
A médio prazo, o maior desafio é penetrar no mercado da governação eletrónica de outros países da sub-região. 

NOSI 2

Quais os principais constrangimentos com que se depara o NOSi?
A transformação de uma estrutura orgânica do Governo para uma entidade pública empresarial, a dependência tecnológica, e a capacitação de Recursos Humanos.

Qual a estratégia delineada para ultrapassar esses constrangimentos?
A transformação do NOSi numa entidade pública empresarial exige uma adesão ao princípio de “quem beneficia-paga, quem paga-exige”, e requer uma mudança de práticas e processos de negócio tanto do lado do NOSi (com uma atitude muito mais “comercial” perante os clientes), como do lado dos clientes (com um “reconhecimento” de que os serviços prestados devem ser adequadamente remunerados para garantir a sua continuidade).
A dependência tecnológica dos fornecedores de ferramentas tecnológicas é um facto difícil de contornar. A rápida obsolescência das tecnologias obriga o NOSi a um esforço constante de aquisição de equipamentos e de contratação de manutenção e suporte. O NOSi tem de ter um cuidado especial na definição da sua arquitetura tecnológica e na escolha de novas ferramentas, por isso mantém um programa de POC – Proof Of Concept que permite decidir sobre a adoção de novas ferramentas e soluções tecnológicas. E também usa o mercado de uma maneira concorrencial de modo a garantir os melhores preços, prazos e qualidade.

"O NOSi não tem capacidade de retenção de recursos por via salarial"


E quanto aos Recursos Humanos, quais são os principais desafios enfrentados pela liderança numa entidade de cariz tecnológico como o NOSi?

O recrutamento de recursos capacitados e a capacitação de recursos recrutados são duas faces de uma mesma moeda. O NOSi não tem capacidade de retenção de recursos por via salarial e por isso tem de manter um programa de estágio capaz de constantemente identificar novos recursos e talentos.

Mas depois há o outro lado da moeda: a oportunidade de encabeçar e moldar uma jovem equipa composta por quadros qualificados, o que acaba por ser desafiante para um líder.
Em todos os desafios há oportunidades. No desafio de liderar o NOSi existe uma oportunidade de construir uma capacidade nacional no setor das NTIC (Novas Tecnologias de Informação e Comunicação), fazer desenvolver este setor para lá das fronteiras de Cabo Verde e oferecer oportunidades a muitos jovens cabo-verdianos de “ser tudo o que puderem ser”. 

Se pudesse dar um único conselho aos líderes (tanto públicos como privados) em Cabo Verde, qual seria? 
Não dê conselhos, lidere a caminhada. 

Por fim, qual o papel da inovação no NOSi? Pode dar exemplos?
O NOSi tem sido pioneiro naquilo que faz e por isso inova constantemente em diversos níveis de serviços que presta. Um exemplo de inovação é o IGRP - Integrated Government Resource Planning, uma plataforma proprietária desenvolvida pelo NOSi para desenvolver software de governação eletrónica através de um gerador de código. O IGRP é tão eficaz que hoje é usado no NOSi quase exclusivamente para o desenvolvimento de software de governação eletrónica, sendo também usado por alguns países da CPLP - Comunidade dos Países de Língua Portuguesa, sob licença.

19-04-2017


Armanda Alexandre/Portal da Liderança


António Joaquim Fernandes 
é CEO do NOSi - Núcleo Operacional da Sociedade de Informação, empresa estatal cabo-verdiana de TIC (tecnologias de informação e comunicação) para o desenvolvimento de soluções de governação eletrónica.
O professor de Física e Matemática na Universidade de Cabo Verde é formado em Engenharia Oceânica pelo Instituto de Tecnologia da Flórida, EUA, e é mestre em Física e Matemática pela também americana Ball State University. Após ter trabalhado mais de 30 anos como engenheiro em vários campos decidiu dedicar-se a tempo integral ao ensino. O seu percurso profissional inclui ainda cargos governamentais, primeiro como ministro das Infra-Estruturas e depois como ministro da Educação de Cabo Verde.