Como mudar um país conservador – Camilo Lourenço

Como mudar um país conservador – Camilo Lourenço

Mudança. É a única certeza da vida. Além da Morte.

Da Morte, deixemos quem de direito ocupar-se dela. Mas a Mudança é matéria do domínio das empresas. É ela que faz a diferença entre projectos que sobrevivem a gerações e projectos que sucumbem ao fim de uma geração. 

Quer um exemplo? O índice Dow Jones, a referência da principal praça financeira do mundo. Sabe quantas empresas sobrevivem no índice desde a sua criação? A General Electric. Ora isso acontece numa economia muito atreita à mudança.

Mas voltemos à questão principal. Se a Mudança é assim tão importante, porque resistimos tanto a ela? Mais importante: onde se posiciona Portugal neste ranking da Mudança? 

Tenho para mim que somos um dos países mais conservadores da Europa (o que é curioso, porque no século XV fomos o pioneiro da Mudança). E não estou sozinho na “acusação”. Há dias, o Jornal de Negócios publicou uma entrevista com a responsável pela última reforma do IVA. Na entrevista, a propósito de resistências culturais à mudança, a professora na Universidade de Durham dizia que, em Portugal, a resistência “é mais forte do que noutros países”. 

E foi mais longe: “Em Portugal há um conservadorismo no verdadeiro sentido da palavra: as pessoas querem manter tudo como está”. E, a terminar, avançou com uma conclusão preocupante: “Mesmo que seja mau (a situação que querem manter), temem que o que vem possa ser ainda pior”.

Não tenho nenhum estudo que me permita fundamentar a tese de que somos os mais conservadores da Europa. Mas isso interessa pouco; os resultados comprovam a nossa resistência à mudança. Fizemos poucas grandes alterações na nossa economia desde a Revolução de Abril: a lei laboral, até à Troika, foi a que menos mexeu; a lei do arrendamento, apesar das mexidas, continua a proteger excessivamente os inquilinos (prejudicando o aumento da oferta); a organização do Estado é basicamente a mesma que em 1974…

Não existe uma fórmula secreta para mudar este estado de coisas. E muito menos numa ou duas gerações. O que nos remete para a pergunta: o que fazer então? É que não podemos continuar neste rame-rame que, progressivamente, nos afunda na pobreza... 

Se calhar, a resposta é mais simples do que parece. Uma das formas de acelerar a mudança é pôr o agente conservador a “conviver” mais de perto com o agente “progressista”. Em palavras simples, isso quer dizer: abrir a economia; deixar entrar mais estrangeiros; reduzir o peso dos activos em mãos portuguesas, colocando-os nas mãos dos “progressistas”.

Pergunta: não foi isso que a Troika pretendeu fazer, ao obrigar à aceleração das privatizações? Tenho para mim que esse vai ser um dos melhores, e mais duradouros, resultados da intervenção externa em Portugal. Vai uma aposta?

 


Camilo-Lourenco-colunaCamilo Lourenço é licenciado em Direito Económico pela Universidade de Lisboa. Passou ainda pela Universidade de Columbia, em Nova Iorque e University of Michigan, onde fez uma especialização em jornalismo financeiro. Passou também pela Universidade Católica Portuguesa. Comentador de assuntos económicos e financeiros em vários canais de televisão generalista, é também docente universitário. Em 2010, por solicitação de várias entidades (portuguesas e multinacionais), começou a fazer palestras de formação, dirigidas aos quadros médios e superiores, em áreas como Liderança, Marketing e Gestão. Em 2007 estreou-se na escrita, sendo o seu livro mais recente “Saiam da Frente!”, sobre os protagonistas das três bancarrotas sofridas por Portugal que continuam no poder.