Escute: o seu poder de influência começa naquilo que lhe dizem

Escute: o seu poder de influência começa naquilo que lhe dizem
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Se queremos deixar a nossa marca, se queremos influenciar, devemos começar por escutar (mais e melhor) o que nos dizem. Parece simples. Afinal, a maioria de nós fá-lo todos os dias. Mas será que estamos realmente a escutar? Ou estamos à espera da nossa vez para falar?

Carla Rocha

Ainda temos trabalho a fazer no que diz respeito à atenção que dedicamos às pessoas e ao que elas nos dizem. Temos alguma dificuldade em manter o silêncio numa conversa ou reunião. Em escutar o outro, as suas perspetivas e motivações. Como se nos sentíssemos remetidos para o papel de espetadores e isso nos retirasse prestígio ou poder. É precisamente o contrário. É nesse lugar de silêncio e de escuta que a nossa mente se liberta da pressão de entregar, e que somos capazes de compreender o que nos rodeia e ir ao encontro do que é necessário em cada momento. Esse é o primeiro passo para deixarmos a nossa marca nos outros e no mundo.

Há uns anos encontrei numa estação de serviço o livro “Como Fazer Amigos e Influenciar Pessoas”, levei-o para casa e devorei-o em poucas horas. Da autoria de Dale Carnegie, é uma referência na área da comunicação e das relações interpessoais e mostra-nos que sempre que damos importância a alguém, sempre que valorizamos as suas ideias e pontos de vista, estamos mais perto de influenciar essa pessoa. É fascinante como um livro escrito na primeira metade do séc. XX (1937) nos dá uma orientação tão clara e necessária para os dias de hoje, em que a imensidão de palavras, de partilhas e tweets nos absorve de tal maneira, que praticamente nos sentimos impelidos a ser parte ativa desse ruído. Esquecemo-nos, muitas vezes, do outro. Precisamos de redefinir a forma como nos relacionamos. E se queremos deixar a nossa marca, se queremos influenciar, devemos começar por escutar (mais e melhor) o que os outros nos dizem.

Parece simples. Afinal, a maioria de nós fá-lo todos os dias. Mas será que estamos realmente a escutar? Ou estamos à espera da nossa vez para falar? Quando vamos de viagem, podemos estar tão focados em chegar ao destino que não olhamos pela janela do carro durante o caminho; ou podemos aproveitar para admirar a paisagem, para reparar nos detalhes e nos pormenores que tornam cada viagem única. Nas relações às vezes também é assim: ficamos à espera do momento em que o outro termina de falar (outras vezes nem esperamos…) para tomarmos a palavra e seguirmos com o nosso raciocínio, sem repararmos exatamente no que nos estão a dizer.

Nas formações que dou, muitas vezes dizem-me que este é o aspeto que mais precisam de melhorar na comunicação, até porque muitas vezes também estão “do outro lado”; aliás, todos nós já tivemos conversas em que sentimos que não somos realmente ouvidos e compreendidos. Que não nos deram espaço para nos afirmarmos. Isto acontece nas nossas casas, num café entre amigos e no nosso local de trabalho.

Um estudo realizado nos EUA pelo The Workforce Institute concluiu que dois em cada três trabalhadores sentem que os líderes não os ouvem ou ignoram o que eles têm para dizer. O impacto na motivação e, consequentemente, na produtividade, é enorme. O mesmo estudo destaca ainda que um terço dos trabalhadores, num ambiente organizacional que não estimula a escuta, não se sente confiante para partilhar ideias e preocupações com a liderança, e por isso gostava de deixar a empresa. É a retenção de talento que também fica em cheque.

Então esta é uma competência que merece um investimento contínuo por parte das lideranças: saber escutar. Um líder que escuta a sua equipa é capaz de perceber as suas motivações e com isso vai tomar melhores decisões para o negócio, diminuir riscos e melhorar a experiência dos colaboradores na empresa. É importante fazê-lo bem.

Como? Escutar implica, antes de mais, dar atenção plena. Depois, ter abertura ao ponto de vista do outro. E por fim, um aspeto determinante e ainda frequentemente desvalorizado na comunicação: o silêncio. Silêncio não é só para a outra pessoa poder expor as suas ideias e pontos de vista, também é para nós podermos processar o que estamos a receber e, sobretudo, o que vamos entregar a seguir. Para recolhermos toda a informação que precisamos e elaborarmos o que vamos dizer, não correndo o risco de dizer algo que é mal-interpretado ou de que nos arrependemos mais tarde.

A revista “Time” dedicou recentemente algumas páginas a este tema. O artigo fala de um fenómeno que nos EUA é descrito como talkaholism”, que se refere a pessoas que falam demasiado e não param para pensar. Nos anos 1990 investigadores da Universidade da Virgínia elaboraram um questionário para avaliar pessoas que sofrem desta condição – não conseguirem controlar o movimento acelerado das palavras, o que implica, em determinados momentos, algum tipo de conflito.

Há um exercício que todos, independentemente do contexto em que estamos, podemos fazer: não cedermos ao impulso de reagir em palavras no imediato; antes fazer uma pausa e usar esse momento de silêncio para escolher as palavras mais adequadas. Não se trata de calarmos a nossa opinião ou uma eventual crítica. É fundamental darmos o nosso contributo. A nossa voz importa. O que queremos é que as palavras saiam com assertividade e poder. Que tenham o efeito desejado. Pense naquelas pessoas que numa reunião não intervêm muito, mas quando o fazem dão contributos valiosos.

É importante interiorizarmos que a capacidade de influência não se mede pela quantidade de vezes que falamos numa reunião ou numa conversa. Mas talvez se possa medir pela capacidade de não nos sentirmos desconfortáveis num silêncio, porque temos a consciência de que é nesse silêncio que se conquista a qualidade de um argumento, de uma conversa ou de uma reunião. Em última instância, de uma relação.

Quando comecei na rádio achava que o silêncio era constrangedor, e esforçava-me por preenchê-lo. Quando tinha um convidado estava mais preocupada em lançar as perguntas que tinha preparado, para não correr o risco de haver uma pausa, do que em escutar as respostas que me estavam a dar, e que podiam levar a questões novas. Hoje percebo o lugar que o silêncio ocupa na comunicação e na capacidade de criarmos ligação, de nos relacionarmos e, com isso, de influenciarmos.

Mais do que isso, ao escaparmos à ânsia de ter de preencher todos os silêncios, a nossa mente fica mais disponível para reajustarmos o nosso ponto de vista. Então acontece esta coisa maravilhosa que é: nós próprios aprendemos. E isso é transformador!

26-04-2023

Portal da Liderança


CarlaRocha

Carla Rocha é apresentadora na Renascença e consultora na área de comunicação. Na sua experiência de quase 30 anos de rádio esteve à frente de programas líderes de audiência em Portugal como “As 3 da Manhã” na Renascença, o “Café da Manhã” ou o talk show “Rocha no Ar” na RFM. Enquanto consultora em comunicação tem vindo a colaborar com empresas portuguesas e internacionais, nas quais implementa programas de formação. Fundou a empresa Carla Rocha Comunicação, a Academia Fale Menos, Comunique Mais e a Academia Fale Menos, Influencie Mais, com o objetivo de partilhar técnicas e estratégias de comunicação mais eficaz, influente e autêntica.
Licenciada em Ciências da Comunicação pela Universidade Autónoma de Lisboa; pós-graduada em Gestão de Marketing, Comunicação e Multimédia pelo Instituto Superior de Economia e pós-graduada em Gestão Aplicada para Gestores de PME pela Nova School of Business and Economics (Nova SBE), completou os cursos Leadership Principles (2021), Management Essentials (2021) e Negotiation Mastery (2022) na Harvard Business School Online, tendo obtido o Certificate of Specialization in Leadership and Management. Concluiu o curso Liderança no Futuro do Trabalho na Nova SBE. É docente na pós-graduação em Gestão do Bem-Estar e da Felicidade Organizacional na Faculdade Egas Moniz e do MBA Organisational Happiness no ISEC Lisboa - Instituto Superior de Educação e Ciências. Colabora com a Universidade Católica Portuguesa nos Programas de Executivos e com a Nova SBE no Mestrado Executivo em Liderança.
Foi curadora e oradora do TEDxULisboa e coordenadora do programa Atletas Speakers (desenvolvido pelo Comité Olímpico de Portugal, treina e orienta atletas olímpicos enquanto oradores). Tem participado em várias convenções e formações intensivas da National Speakers Association, nos EUA, sobre como falar em público.
Autora dos livros “Fale Menos Comunique Mais – 10 Estratégias para se Tornar um Grande Comunicador” e “Fale Menos Influencie Mais - 5 Estratégias para ser Ouvido e Comunicar com Influência”, tem vários artigos sobre comunicação publicados em livros e em revistas das mais variadas áreas temáticas.