O “talent business solutions” vale 26 mil milhões?

O “talent business solutions” vale 26 mil milhões?

O que levou a empresa a pagar tanto dinheiro por uma rede social? O LinkedIn não tem o mesmo número de membros do Facebook: são 100 milhões contra 1,6 mil milhões… É verdade; mas tem pessoas mais influentes na sua rede. O Facebook é uma mera rede social, o LinkedIn é uma rede profissional.

Camilo Lourenço

A Microsoft comprou o LinkedIn por 26,2 mil milhões de dólares. Em dinheiro vivo, ou seja, sem troca de ações. Quase um quarto do que a troika emprestou a Portugal em 2011. Uma pipa de massa, portanto, embora inferior ao cash-flow que a Microsoft gera por ano.

Primeira pergunta: o que levou a empresa a pagar tanto dinheiro por uma rede social? O LinkedIn não tem o mesmo número de membros do Facebook: são 100 milhões contra 1,6 mil milhões… É verdade; mas tem pessoas mais influentes na sua rede. O Facebook é uma mera rede social, o LinkedIn é uma rede profissional.

Segunda pergunta: valeu a pena pagar tanto dinheiro pela empresa? Isso depende da sua fé, que nos está a ler. E, portanto, se quiser uma resposta é só percorrer a internet à procura de artigos que apontem para um ou para outro lado. Aliás, se alargar um pouco a procura chegará a duas conclusões: a história recente do mundo empresarial está cheia destes exemplos. Vindos dos mais variados sítios: a aquisição da Nokia pela Microsoft (5,4 mil milhões), a compra da Skype pela mesma Microsoft (8,5 mil milhões), a aquisição do Youtube pela Google (1,65 mil milhões), a compra da Sun pela Oracle (7,4 mil milhões)…

Terceira pergunta: a compra do LinkedIn faz sentido? Há opiniões para todos os gostos. É claro que quando se olha para as declarações da empresa, as coisas parecem ter lógica. Satya Nadella, CEO do gigante de Redmond, vendeu assim a ideia: “Este negócio reúne a cloud de profissionais líder no mundo com a rede social de profissionais líder mundial... O LinkedIn vai manter a sua marca e independência, bem como a sua cultura, que está muito alinhada com a nossa”.

É mesmo assim? Não sei. É verdade que a Microsoft, sob a batuta de Nadella, está a proceder a um “shift” (mudança) na sua atividade: abandonou o negócio dos telemóveis (o que confirma a ideia de que torrou biliões na compra da Nokia) e está a concentrar-se na cloud. Mas daí a dizer que o LinkedIn encaixa na sua estratégia vai uma longa distância. Mais: a aquisição acontece numa altura crítica para a própria LinkedIn. A empresa registou, no início deste ano, uma quebra acentuada nas ações (50%) quando comunicou ao mercado que o seu serviço de “talent business” (uma espécie de online head hunting) está em desaceleração. Terá sido essa a razão que levou a Microsoft a acelerar a aquisição da empresa (a mesma razão que aponta o Twitter, cujo preço caiu 60%, como o próximo alvo)? Se foi, é um erro: as aquisições devem ser determinadas pela estratégia e não por razões oportunísticas.

O negócio de M&A (fusão e aquisição de empresas) é como o Excel: aceita tudo o que lá se põe. O problema é a ressaca, o momento de fazer contas e perceber se o dinheiro gasto fez sentido. E aqui é que "a porca torce o rabo"…

Antes de escrever este artigo, passei algum tempo a analisar o que a imprensa e os analistas disseram de outras aquisições no passado… e o que delas resultou. O exercício provocou-me arrepios na espinha. E suscitou uma dúvida: quando as empresas estão sentadas em cima de um monte de dinheiro, a tendência para errar aumenta exponencialmente.

14-06-2016

CamiloOPCamilo Lourenço, licenciado em Direito Económico pela Universidade de Lisboa, passou pela Universidade Católica Portuguesa, bem como pela Universidade de Columbia, em Nova Iorque, e também pela americana Universidade de Michigan, onde fez uma especialização em jornalismo financeiro. Comentador de assuntos económicos e financeiros em vários canais de televisão generalista, é ainda docente universitário. Em 2010, por solicitação de várias entidades (portuguesas e multinacionais), começou a realizar palestras de formação dirigidas aos quadros médios e superiores, em áreas como liderança, marketing e gestão. Em 2007 estreou-se na escrita. No seu livro mais recente, “Fartos de Ser Pobres”, volta "a pôr o dedo na ferida", analisando os resultados eleitorais, os vários cenários políticos e os novos desafios para a economia.