Pedro Soares dos Santos: Falta a Portugal comunicação e união de esforços

Pedro Soares dos Santos: Falta a Portugal comunicação e união de esforços
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Pedro Soares dos Santos, Presidente do Conselho de Administração e Administrador-Delegado da Jerónimo Martins (JM), diz que “a maior conquista da JM nos últimos anos foi o reforço do processo de internacionalização, com a entrada na Colômbia”. Soares dos Santos é o Líder na Gestão de Empresa Privada do Best Leader Awards 2013, atribuído pela Leadership Business Consulting e pelo SOL. 

Um bom líder deve saber rodear-se de gestores talentosos, honestos e leais.

Quais os pontos fortes que um bom líder em gestão de empresa privada deve potenciar?

Penso que a principal preocupação de qualquer líder de empresa, seja privada ou pública, deve ser o desenvolvimento de equipas fortes, equilibradas e responsavelmente ambiciosas. Em relação a si próprio, um bom líder deve saber rodear-se de gestores talentosos, honestos e leais.

E os pontos fracos proibitivos? 

O principal ponto fraco ou armadilha que um bom líder deve evitar ao máximo é a acomodação quando as coisas correm bem. Acredito em cultivar um estado de inquietude nas lideranças, de forma a não deixar instalar falsas confianças e a vaidade, da qual nasce a arrogância e a incapacidade de verdadeiramente ouvir as pessoas, e o mercado. 

Qual foi a maior conquista da Jerónimo Martins (JM) sob o seu comando? 

Iniciei agora o segundo mandato, de três anos, como administrador-delegado do grupo JM. Julgo que conseguimos nos últimos três anos (2010-2012) conquistas importantes, como um enorme crescimento das vendas na Polónia (81%), muito em virtude da rigorosa execução que temos vindo a fazer do plano de expansão, que nos levará a ter cerca de 3 mil lojas no final de 2015. Enquanto grupo conseguimos, naquele período, aumentar as vendas em mais de 3,5 mil milhões de euros, os lucros (relativamente ao final de 2009) cresceram 80%, enquanto reduzimos a dívida para cerca de metade. No entanto, a que considero a maior conquista da da JM nos últimos anos foi, sem dúvida, o reforço do processo de internacionalização, com a entrada na Colômbia, onde iniciámos atividade comercial em março.

E o maior risco? 

O maior risco que temos de antecipar e evitar é a diluição de identidade do grupo Jerónimo Martins e, de algum modo, alguma perda da força da cultura empresarial que pode resultar do ganho crescente de dimensão internacional.

A Jerónimo Martins está a transformar-se numa multinacional. Como se preparou para entrar na Colômbia, por exemplo?

Entrar num novo mercado é sempre um estímulo à curiosidade, à descoberta, à vontade de fazer diferente. E deve constituir também um exercício de humildade, já que a experiência acumulada ajuda muito, mas não é, por si só, garantia de êxito.


A melhor preparação passa sempre pelo conhecimento da história do país, da realidade local, dos hábitos e gostos dos consumidores, do tecido produtivo. Sem esquecer a intuição, que tem um papel decisivo.


Já manifestou preocupações face à situação de Portugal. Como avalia os nossos líderes políticos?

São líderes bem-intencionados e empenhados, com uma tarefa dramaticamente difícil. Fazer escolhas quando estamos reféns de credores é uma missão muito ingrata. Fácil de criticar, mas que deve merecer respeito. Compreendendo as dificuldades e a exigência do momento que atravessamos, não acredito em políticas que tenham como efeito reduzir a competitividade na economia, seja a nível nacional ou europeu, porque só prejudicam o desenvolvimento de uma economia verdadeiramente forte e dinâmica e os direitos e interesses dos cidadãos.

E os líderes empresariais?

A maioria do tecido empresarial português é constituído por micro e PME, lideradas por empreendedores que devem ser respeitados e que são muitas vezes esquecidos. Quanto às empresas de maior dimensão, faltam a Portugal comunicação e união de esforços entre os empresários.

Há algum crash course que aconselharia?

Não conheço com rigor a dimensão e a profundidade do problema português para me permitir dar conselhos a quem tem o problema nas mãos. Julgo que temos de reconhecer que o País faliu e que precisa de reagir com a união de esforços de todos. Talvez sugerisse apenas maior capacidade de escuta dos vários agentes sociais e económicos, maior mobilização de vontades, maior envolvimento com vista ao alcance de verdadeiras soluções. E, para mim, nenhuma verdadeira solução pode passar por políticas que tenham como efeito reduzir a competitividade na economia, seja a nível nacional seja no quadro europeu, na medida em que, no final do dia, tal só prejudicará o desenvolvimento de uma economia forte e dinâmica e os legítimos direitos e interesses dos cidadãos.

De que forma as empresas portuguesas no exterior estão a contribuir para a imagem do País junto dos mercados? 

Não posso falar pelas outras empresas. No caso da Jerónimo Martins, tenho evidências que demonstram o respeito que já conquistámos nos países estrangeiros onde operamos e que nos esforçamos diariamente por continuar a merecer e a reforçar. 

Quais os obstáculos que esta crise coloca aos atuais líderes empresariais? 

Os principais obstáculos prendem-se com a diminuição radical das oportunidades para criar emprego, para desenvolver carreiras, para aumentar o nível de vida dos colaboradores. Paralelamente, o empobrecimento real dos portugueses acaba por ter como efeito um retrocesso, de vários anos, nos hábitos e padrões de consumo, com a consequente desaceleração da inovação nos produtos e serviços e um reforço do enfoque nos aspetos mais essenciais, como o preço.

A Jerónimo Martins é uma empresa familiar. Que vantagens e desvantagens traz este facto a um líder?

A Jerónimo Martins é uma empresa controlada a 56% por uma sociedade familiar, o que é diferente de ser uma empresa familiar. Estamos cotados na bolsa de Lisboa desde 1989. E temos milhares de acionistas minoritários, que têm o legítimo direito de escrutinar a nossa atividade. Julgo que a principal característica que distingue as empresas com uma dimensão familiar forte é a estabilidade acionista e a valorização da gestão também para o longo prazo. O processo de tomada das decisões pode, por vezes, ser mais longo e mais discutido, mas isso contribui para tornar as decisões mais robustas e para reforçar o compromisso com elas.


Assumir a responsabilidade de gerir um património que também é da família retira liberdade ao líder, na medida em que, verdadeiramente, ninguém se pode demitir da sua família.


Durante vários anos foi o seu pai, Alexandre Soares dos Santos, que conduziu a companhia. Que diferenças e semelhanças há no tipo de liderança de ambos?

Somos ambos muito orientados para resultados, obtidos no respeito por princípios e valores fundamentais, entre os quais se destaca o respeito pelas pessoas.

Segundo Alexandre Soares dos Santos, foi a família que pediu que ficasse mais tempo como chairman, apesar de querer sair. Porquê?

Entre 2013 e 2015, teremos desafios muito exigentes: cumprir o plano de expansão na Polónia que nos levará a ter, no final de 2015, 3.000 lojas; a boa descolagem da operação colombiana, que estimamos venha a fechar 2015 com cerca de 150 lojas; e a defesa das nossas posições de mercado em Portugal, onde os tempos estão muito difíceis. Num período em que eu e a minha equipa mais próxima seremos obrigados a muitas ausências em viagens, era importante assegurar uma lógica de continuidade ao nível da cúpula do grupo para não prejudicar o foco. Não será fácil para ninguém suceder ao meu pai, muito menos num período em que a disponibilidade física da gestão de topo para construir relações do zero está francamente diminuída.

Como se mantém a moral/ânimo de colaboradores em organizações que estão a fazer downsizing? 

Julgo que uma empresa que não consiga evitar os despedimentos só poderá, de algum modo, limitar o potencial destrutivo desse movimento se conseguir comunicar, com verdade, o estado de necessidade que a leva a esse exercício, os critérios que seguiu na sua implementação e o cuidado colocado no tratamento das pessoas que tenham forçosamente de sair. 

Face à conjuntura de crise atual, como motivar as equipas?

Tendo esquemas de remuneração variável que abrangem todos os níveis da empresa, que premeiam o mérito e a obtenção de resultados; tendo prémios extraordinários para as pessoas das lojas e dos centros de distribuição; criando políticas e mecanismos de apoio social aos colaboradores em situação mais frágil, como fizemos logo em 2011, com a constituição do Fundo de Emergência Social, que dotamos anualmente de cerca de 2,5 milhões de euros para auxiliar os nossos colaboradores em dificuldades e as suas famílias.

Quais as grandes dificuldades que o seu setor enfrenta, a curto e a médio prazo? 

A principal dificuldade prende-se, fundamentalmente, com a perda de poder de compra e com a quebra dos níveis de confiança dos consumidores.

E oportunidades? 

O setor é suficientemente heterogéneo para tornar difícil a identificação de uma oportunidade partilhável por todos. Para o grupo Jerónimo Martins, as oportunidades no curto e médio prazo passam sempre pela consolidação da internacionalização.

Entrevistas conduzidas pelo SOL e Oje.

 


Pedro-Soares-Santos-JMPedro Soares dos Santos é administrador-delegado e membro do Conselho de Administração da Jerónimo Martins (JM). Frequentou vários cursos de gestão em universidades internacionais como a Kellogg, Harvard, IMD, ou Darden, e iniciou a carreira profissional em 1983, na direção de operações do Pingo Doce. Dois anos depois, Pedro Soares dos Santos passou a desempenhar funções nas áreas de vendas e marketing da Iglo/Olá. Em 1990 ingressou no Recheio como diretor de operações. Em 1995 foi nomeado diretor-geral do Recheio e eleito administrador da Jerónimo Martins. Passados quatro anos ficou responsável pelas operações da JM na Polónia e no Brasil. Em 2001, e nos oito anos seguintes, assumiu a área da distribuição do grupo. É membro da Comissão Executiva da JM até 2009.