Can you deliver? But please, don't overpromise... – Camilo Lourenço

Can you deliver? But please, don't overpromise... – Camilo Lourenço

É um “déjà vu”: alguém que se candidata a certo lugar propondo mundos e fundos, e que acaba por não “entregar” (no sentido de “deliver”) nem 20% do que prometeu. Não, não é apenas na política; o mundo dos negócios está cheio de líderes que exageram na promessa de “entrega”.

Recordo-me de uma entrevista de Carly Fiorina na revista “Fortune”, onde explicava porque tinha sido contratada para dirigir a Hewlett-Packard. Fiorina, na altura uma das executivas mais badaladas dos EUA, dizia que tinha convencido o “board” com a sua visão para a empresa. 

De facto o seu currículo era convincente: depois de abandonar Direito, trabalhara como assistente na AT&T, empresa onde subiu a pulso. A tal ponto que, quando em 1996 a AT&T fez o spin-off das divisões Bell Balbs e Western Labs, Fiorina foi a escolhida para a tarefa. Dois anos depois, mercê do bom trabalho, assumiu a direcção da divisão de “Global Service Provider” da Lucent Technologias, uma das estrelas da economia digital. 

Os resultados foram tão bons que a “Fortune” elegeu-a como a mulher mais poderosa da América. E dali para a Hewlett-Packard foi um salto. 

O desafio na HP era difícil: sucedia a Lewis Platt, engenheiro de formação, que deixara marca na empresa graças à aposta no negócio dos PC e impressoras. Só que Platt não percebeu a importância da Internet no mundo da tecnologia e acabou por sair. 

A ascensão a CEO da HP foi um “boost” tremendo para a imagem da menina que um dia dissera ao pai não querer mais seguir Direito. Até porque era a primeira mulher a chegar a CEO da lista Fortune 100. 

Fiorina tinha o mundo dos negócios focado em si. Não apenas porque se esperava que desse um novo rumo à HP, mas porque era a grande esperança do “female corporate world”. Só que quem seguia a empresa começou a perceber, pouco tempo depois, que algo corria mal. O “sonho” da transformação da HP demorava a arrancar… e apareciam os primeiros “cracks” na sua imagem de líder eficaz. 

Em 2002 Fiorina tentou um salto em frente, convencendo os accionistas da HP e da Compaq a fundir as empresas. Só que a fusão não correu como o esperado e em 2005 os accionistas tiraram-lhe o tapete.  

Não sei se terá sido a fama a afectar o seu sentido de liderança; ou se foi a dificuldade em mudar uma empresa viciada no hardware. Mas aquilo que “entregou”, aos accionistas foi modesto… por exemplo, com o fim da bolha das dot-com a HP entrou numa espiral onde perdeu 50% da sua capitalização bolsista. 

A passagem de Fiorina pela HP é um bom exemplo de como o mundo dos negócios é implacável. Quando se escolhe um líder este tem mesmo de “entregar” o que prometeu aos accionistas. O “overpromising” acaba quase sempre mal. 

P.S. - Regressando a Fiorina, resta dizer que a sua vida nunca mais foi a mesma. Depois das empresas tentou a política mas falhou a eleição para o Congresso dos EUA.

 


Camilo-Lourenco-colunaCamilo Lourenço é licenciado em Direito Económico pela Universidade de Lisboa. Passou ainda pela Universidade de Columbia, em Nova Iorque e University of Michigan, onde fez uma especialização em jornalismo financeiro. Passou também pela Universidade Católica Portuguesa. Comentador de assuntos económicos e financeiros em vários canais de televisão generalista, é também docente universitário. Em 2010, por solicitação de várias entidades (portuguesas e multinacionais), começou a fazer palestras de formação, dirigidas aos quadros médios e superiores, em áreas como Liderança, Marketing e Gestão. Em 2007 estreou-se na escrita, sendo o seu livro mais recente “Saiam da Frente!”, sobre os protagonistas das três bancarrotas sofridas por Portugal que continuam no poder.