São as empresas, são as empresas! – Camilo Lourenço

São as empresas, são as empresas! – Camilo Lourenço

Eu não gosto de dar aos textos de Gestão conotações políticas. Mas como o leitor sabe já entramos em “election mode”. E como a campanha eleitoral é fértil em promessas, convém olhar minimamente para elas… no que às empresas diz respeito.

Em matéria de empresas, a única questão relevante é saber se os partidos pretendem facilitar a vida às empresas. E neste aspeto há duas questões que ganham relevância: a burocracia e a fiscalidade. 

Na burocracia não se pode esperar muito. Ela está intimamente ligada ao emprego na Administração Pública. Eu explico: qualquer consultor, até o menos dotado, sabe que há certos empregos, ou funções, que não se eliminam no Estado porque eles existem para empregar pessoas. Há certos atos da Administração que poderiam ser todos tomados pelo mesmo departamento do Estado. Em vez disso, as empresas são obrigadas a viver uma autêntica via sacra para obter uma decisão, passando por vários ministérios e direções-gerais. 

Moral da história: como reformar este estado de coisas implica fechar departamentos e despedir pessoas, as empresas não podem esperar grande ajuda na diminuição da burocracia.

Na fiscalidade a questão é diferente. Ao contrário do que por vezes se afirma, a fiscalidade infuencia decisivamente as decisões de investimento. É uma questão de contas: se uma empresa se deparar com um país onde os lucros são tributados a 23% quando outro os tributa a 15%, a escolha é óbvia. E se a esse fator se juntarem outros, como a qualidade da força de trabalho e menos carga burocrática (para não falar de mercado laboral flexível), as dúvidas que ainda possa haver desaparecem. 

Este é o maior problema que Portugal enfrenta: o país precisa de um largo consenso na questão do “tratamento” a dar às empresas. E nos últimos anos foram dados alguns passos nesse sentido: PSD, CDS e PS entenderam-se na necessidade de baixar progressivamente o imposto a cobrar pelos lucros das empresas (IRC). O objetivo era colocar o IRC em 17% em 2019 (21% em 20105). 

De repente mudou tudo: maioria e PS desentenderam-se aquando da elaboração do OE para 2015 e o acordo ficou em causa. Mais: o programa do PS, para as legislativas, prevê uma pausa no esforço de descida do IRC em 2016.

Não está em causa saber de quem é a culpa; se fosse a coligação a quebrar o consenso nesta área, a questão seria igualmente grave. O que interessa realçar é que isto é a pior maneira de incentivar as empresas a investir. Não apenas porque passam a pagar mais impostos do que contavam, mas sobretudo porque percebem que em Portugal não há estabilidade fiscal. E que os partidos rasgam acordos de regime com a mesma facilidade com que se rasgam papéis de rascunho. 

Portugal, e os países latinos, têm um problema: desconfiam das empresas. Tudo o que seja facilitar a sua vida, é mau. Porque as empresas são olhadas como um mal necessário na sociedade; então se tiverem lucro, o assunto transforma-se em anátema... 

É um erro. As empresas são o principal meio para se criar riqueza e ocupar a força de trabalho de um país. Enquanto não deixarmos de olhar para elas com desconfiança, não vamos ter crescimento económico digno desse nome e redução do desemprego abaixo dos 8%.

 

 

Camilo-Lourenço-FotoNovaCamilo Lourenço é licenciado em Direito Económico pela Universidade de Lisboa. Passou ainda pela Universidade de Columbia, em Nova Iorque e University of Michigan, onde fez uma especialização em jornalismo financeiro. Passou também pela Universidade Católica Portuguesa. Comentador de assuntos económicos e financeiros em vários canais de televisão generalista, é também docente universitário. Em 2010, por solicitação de várias entidades (portuguesas e multinacionais), começou a fazer palestras de formação, dirigidas aos quadros médios e superiores, em áreas como Liderança, Marketing e Gestão. Em 2007 estreou-se na escrita, sendo o seu livro mais recente “Saiam da Frente!”, sobre os protagonistas das três bancarrotas sofridas por Portugal que continuam no poder.