O que distingue um líder bem-sucedido?
Quando defendemos que alguém foi um líder bem-sucedido, usamos o crescimento dos lucros da empresa (ou o crescimento dos fundos da ONG) que lideraram. Quando queremos defender que alguém teve uma carreira de sucesso, usamos o aumento de salário ou, pelo menos, o aumento de responsabilidade e de autoridade.
Ser melhor é ser mais.
Mas não tem que ser assim.
Há duas semanas atrás, o meu filho fez quinze anos. Fomos jantar a um restaurante japonês. A comida era excelente e o restaurante era muito pequeno. Contei pelo menos 6 casais que chegaram sem reserva e, por isso, tiveram que ir jantar a outro lado. Um homem que estava sentado na mesa ao lado da minha, perguntou a uma das empregadas do restaurante se costumava ser assim.
A empregada disse que era sempre assim. Ao almoço, ao jantar, durante a semana, durante o fim de semana.
Porquê?
Porque o dono do restaurante, que também era o chef, não queria que o restaurante crescesse. Não queria aumentar o tamanho do restaurante. Não queria abrir outro restaurante. Não queria. Aquele restaurante tinha o tamanho certo. Pagava as contas. Era suficiente.
Isto é ser um mau empresário? Quem acredita que os líderes devem ser avaliados pelo critério do crescimento, acha que sim. Acha que este empresário não é só incompetente. Também é burro.
Burro, burro, burro. E sem ambição nenhuma.
É que só um burro sem ambição nenhuma deixa de ganhar mais dinheiro, porque não quer pôr mais cinco mesas no raio do restaurante.
Eu acho que o chef do restaurante japonês não só é muito inteligente, mas também é um líder fantástico, porque transmite aos seus colaboradores uma paixão sem limites pela excelência. É que o apetite voraz para o crescimento raramente tem tempo para apreciar a excelência. Quer mais, sempre mais. Desde que a qualidade seja boa, o resto não interessa. A excelência não interessa.
Acho que o chef do restaurante japonês tem muito que ensinar a muitos líderes. Mas estou mais interessado em perceber o que é que ele nos pode ensinar, enquanto pessoas. O chef do restaurante japonês ensina-nos a perguntar qual é o preço do crescimento.
Para si, qual é o preço de fazer mais? Qual é o preço de dar mais um passo na sua carreira?
Quando comecei a escrever, escrevia muito. Escrevia e publicava vários artigos científicos por ano, como é hábito entre os académicos da área da gestão em Portugal. Agora, publico muito menos, mas acho que publico muito melhor. Publico melhor, não só porque estou a publicar em revistas científicas mais exigentes, mas também publico melhor porque o que eu escrevo é mais difícil de escrever e, por isso, obriga-me a trabalhar num nível de exigência muito acima do que o nível em que trabalhava antes. E isso deixa-me mais feliz, porque, quando qualquer um de nós faz um trabalho que o apaixona, fica mais feliz. Ao aumentarmos o nosso nível de exigência e, consequentemente, aumentarmos o nosso nível de excelência, estamos também a correr um maior risco de fracassar, porque estamos a trabalhar na fronteira da competência. Para mim, o preço de escrever mais é desafiar-me menos e, no fim, acabar por escrever pior.
Mas há um custo mais pesado do que o de fazer trabalho de pior qualidade para fazer mais trabalho. É o custo de fazer trabalho de que não se gosta. Foi esse custo que o chef do restaurante japonês conseguiu evitar. Conseguiu continuar a fazer sushi, que é o trabalho que ele gosta de fazer. Conseguiu evitar ser gestor de um conjunto de restaurantes, um trabalho que é capaz de ter muito menos piada do que o desafio de fazer sushi do bom.
O que aprendi com a história do chef do restaurante japonês, é mais importante para mim do que o que posso ensinar com a minha história. É fácil chegar à conclusão de que é mais importante fazer melhor do que fazer mais, mas é muito mais difícil chegar à conclusão de que o objetivo na nossa carreira profissional deve ser parar onde fazemos o melhor (e somos mais felizes), do que tentar chegar o mais longe possível.
É difícil, porque quem mede sucesso, o faz pelo crescimento. Segundo este critério, eu estou pior do que estava antes e o chef do restaurante japonês está pior do que podia estar.
No meu caso, até parece que fiquei mais burro com o doutoramento no MIT. Pois fiquei, fiquei tão burro como o chef do restaurante japonês. Percebi que não quero fazer mais, independentemente do custo que isso tenha para a minha carreira. Quero é ser como o chef do restaurante japonês e ser capaz de parar onde me sinto feliz, porque, assim, sou desafiado todos os dias a fazer melhor.
João Vieira da Cunha é Diretor do Instituto de Investigação e Escola Doutoral da Universidade Europeia de Lisboa e professor visitante na Universidade de Ashrus, na Dinamarca. É doutorado em Gestão pela Sloan School of Management do MIT e Mestre em Comportamento Organizacional pelo ISPA. A sua investigação procura descobrir como é que as empresas podem tirar partido da desobediência dos gestores e dos colaboradores. Tem sido publicado nas principais revistas científicas internacionais na área da gestão e colabora regularmente na imprensa. A sua investigação tem ganho vários prémios internacionais de organizações, como a Academy of Management e a System Dynamics Society. Os seus clientes de consultadoria e formação de executivos incluem o Banco de Portugal, o Ministério da Saúde, a Novabase e o Barclays Bank.