Sucessão familiar com sucesso – Camilo Lourenço

Sucessão familiar com sucesso – Camilo Lourenço
Apenas um pequeno número de empresas familiares sobrevive à 3.ª geração, de acordo com a estatística. Mas há casos interessantes de sucesso, por cinco ordens de razão. 
 

Camilo Lourenço  

Há dias o The Wall Street Journal tinha um artigo muito interessante sobre o sucesso das empresas familiares ao longo de décadas. O texto – da autoria de Peter Jaskiewicz, professor de empreendedorismo na John Molson School of Business, e de James G. Combs, docente na University of Central Florida – baseia-se num estudo que analisou dezenas de empresas familiares. No final, os autores identificam cinco razões que justificam o sucesso dessas empresas, passadas várias gerações.

O tema é relevante porquanto a esmagadora maioria das empresas, na economia portuguesa e noutras economias, é familiar. E a estatística mostra que um pequeno número delas sobrevive à terceira geração. No entanto, continua a haver casos interessantes de empresas que não só sobreviveram à sucessão como se transformaram em casos de grande sucesso. Vamos sumarizar os cinco pontos identificados no estudo: 

1 – Legado empresarial. Trata-se de empresas onde as várias gerações souberam passar às seguintes a história do negócio: como surgiu, as dificuldades que quem o dirigiu enfrentou ao longo do tempo e como foram ultrapassadas. Esta passagem de testemunho, muitas vezes feita à mesa de jantar ou encontros de família, permite transmitir às gerações seguintes a responsabilidade de manter o negócio vivo.

2 – De pequenino se torce o pepino. Os membros mais novos da família tomam contacto com o negócio desde muito cedo. E são encorajados a passar pelas várias áreas de negócio da empresa, desde o “plant floor” às funções mais sofisticadas. 

3 – Educação para o mundo. Os membros mais novos da família são encorajados a estudar nas melhores escolas (mesmo fora do país), frequentemente nas áreas relevantes para o negócio de família. E depois de acabarem os estudos são aconselhados a trabalhar noutras empresas, nomeadamente nas concorrentes. Esta “educação para o mundo” permite às novas gerações o contacto com vários mercados e aprenderem a trabalhar num mundo sem fronteiras.  

4 – Aprender com as gerações mais novas. É o efeito provocado pelo regresso dos “estrangeirados”. Ou seja, quando alguém que esteve a estudar (e trabalhar) noutros mercados regressa a casa traz uma nova visão. Essa visão é passada a quem nesse momento dirige a empresa. No entanto, não se pense que se trata de um mero testemunho, como dizer “lá fora faz-se assim”, ou “a tendência do mercado é por aqui”. Nas empresas com sucesso, a geração mais velha mantém-se à frente do negócio, gerindo o dia a dia enquanto os “estrangeirados” pensam o futuro: novos produtos/serviços, entrada em novos mercados, desafio tecnológico, etc. 

5 – A empresa fica nas mãos de uma única pessoa. A ideia é colocar a empresa nas mãos da pessoa (da nova geração) com mais capacidade para a dirigir e desenvolver. É uma solução complicada porque depende das especificidades, nomeadamente legais, de cada país. Há países onde a lei é mais restritiva, enquanto noutros a solução é mais fácil. A ratio por trás desta situação é evitar que a divisão do património favoreça a dispersão de votos e dificulte a tomada de decisão. 

No entanto a entrega da empresa a um dos membros da família não deve ser feita de modo a prejudicar os outros herdeiros. Estes podem receber uma compensação financeira ou mesmo manter-se em cargos sem poder de decisão (um “advisory board”, por exemplo). Ou podem ser encorajados a criar novos negócios, eventualmente em áreas conexas com a do negócio principal. Por exemplo, uma empresa produtora de vinhos pode ser entregue a um membro da família enquanto os restantes se lançam no negócio da distribuição.

Estes tópicos são suficientes para garantir o sucesso de empresas familiares na transição de uma geração para outra? Não. O sucesso depende também de outros fatores, alguns dos quais aleatórios. Mas dos cinco pontos identificados no estudo, destaco dois: a experiência no exterior e a entrega da empresa a apenas um dos membros da família. Prometo analisar estes dois pontos no próximo artigo para o Portal da Liderança. Venha daí…

23-11-2015

 


Camilo-Lourenço-FotoNovaCamilo Lourenço é licenciado em Direito Económico pela Universidade de Lisboa. Passou ainda pela Universidade de Columbia, em Nova Iorque, e a University of Michigan, onde fez uma especialização em jornalismo financeiro. Passou também pela Universidade Católica Portuguesa. Comentador de assuntos económicos e financeiros em vários canais de televisão generalista, é também docente universitário. Em 2010, por solicitação de várias entidades (portuguesas e multinacionais), começou a fazer palestras de formação, dirigidas aos quadros médios e superiores, em áreas como Liderança, Marketing e Gestão. Em 2007 estreou-se na escrita, sendo o seu livro mais recente “Saiam da Frente!”, sobre os protagonistas das três bancarrotas sofridas por Portugal.