A maior parte dos insucessos nos processos de mudança acontece porque não existe um foco partilhado definido logo no início.
Carlos Oliveira
Quando pergunto aos meus clientes, nos vários mercados onde operamos, o que é gerir a mudança nas suas organizações, cada um dos elementos do conselho de administração ou do nível de direção ou dos operacionais das diversas áreas de atividade tende a ter uma opinião diversa da dos colegas. O mesmo acontece na minha empresa. “Gerir a mudança” é uma questão que gera um caos de interpretações e torna difícil de liderar um processo de transformação que aumente a performance da organização.
Por este motivo partilho três regras, para não ser muito exaustivo, resultantes dos processos de maior sucesso, que podem ser utilizadas pelos líderes para gerir a mudança.
Regra n.º 1: Adotar um modelo de referência, mas adaptá-lo
Uma boa forma de colocar ordem no caos da gestão da mudança é adotar um modelo. Um dos mais conhecidos, práticos, fiáveis e recomendáveis para desenhar e gerir um processo de mudança numa organização é o Modelo de 8 Passos de John Kotter. Apresentado em 1996 no livro "Leading Change", o modelo é ainda hoje o mais utilizado por consultores e por organizações em todo o mundo (a LBC, por exemplo, desenvolveu uma variante).
Mas uma coisa que a experiência de muitos anos de consultoria me mostrou é que “one size does not fit all”. Processos baseados em fórmulas mágicas tendem a falhar. O modelo de Kotter deve ser apenas um referencial, que deve ser adaptado a cada caso. Outros modelos podem ser mais adequados, como o menos conhecido mas mais focado modelo VISAR, de Gary Topchick:
Regra n.º 2: Foco e simplificação
A maior parte dos insucessos nos processos de mudança acontece porque não existe um foco partilhado definido logo no início. Enunciados genéricos e filosóficos, por muito aliciantes que sejam, geram o caos, pois cada pessoa presume coisas diferentes. O mais importante de um processo de mudança é definir logo de início, sem ambiguidades:
a) O que se quer mudar (serviços, operações, pessoas, etc.).
b) Para atingir o quê (quais os KPI - Key Performance Indicators concretos: reduzir ciclo de serviço ao cliente, melhorar a experiência do cliente, melhorar a competitividade da empresa, etc.);
c) Como se mede essa mudança (um plano de atividades e respetivos indicadores, a partir do primeiro dia e em marcos específicos).
Mudar tudo de uma só vez é um dos erros de muitos programas. Mudanças pequenas focadas na performance são diferentes de mudanças focadas na cultura. Mudanças focadas num processo concreto são diferentes de mudanças focadas nas competências core da empresa. Mudar a organização é diferente de mudar as pessoas.
Regra n.º 3: Atuar em 4 eixos que se reforçam
A maior parte dos programas de gestão da mudança que falham está baseada apenas no eixo top-down, i.e., na visão dos líderes da empresa. Um processo de mudança só funciona se envolver quatro eixos: top-down (estratégia e regras definidas no topo), bottom-up (criatividade e soluções concretas vindas das bases), processos transversais (para mudar efetivamente a máquina) e cultura (a verdadeira transformação).
A gestão da mudança está a mudar
A visão da liderança tem mudado ao longo do tempo. Nos anos 1940 e 1950, o líder-herói. A seguir, o líder-racional. Nos anos 70 e 80, o líder-gestor da mudança. Nos anos 90 e ‘00, o líder-autêntico e relacional. Nesta década, avançamos para o líder-cidadão global, cuja atenção vai para além da empresa.
Neste contexto, a gestão de mudança também muda e deve envolver relacionamentos múltiplos para fora da empresa, incluindo a alteração da relação com os clientes, os fornecedores, a comunidade, as redes sociais, os reguladores, etc. A inovação aberta é um dos exemplos da importância dos relacionamentos externos da empresa e da capacidade de atuar fora da bolha corporativa. Os modelos dos negócios digitais (como o da Apple) são outro exemplo de como é a relação com o que está fora da empresa, que define a vantagem competitiva. A gestão da mudança entra aqui num campo ainda mais complexo.
01-02-2016
Carlos Miguel Valleré Oliveira é CEO da LBC, empresa internacional de consultoria de gestão presente em países como a África do Sul, Angola, Brasil, Cabo Verde, EUA, Espanha, Moçambique e Portugal. O antigo presidente da CCILSA – Câmara de Comércio e Indústria Luso Sul-Africana assina a rubrica "Ponto de Vista" no Portal da Liderança sobre os temas da liderança-gestão, economia-sociedade e inovação-empreendedorismo.