Estamos constantemente conectados, o que estende a sobrecarga para o espaço que num passado recente era pessoal e familiar. Em alguns casos há que perguntar se vale a pena tudo o que está a fazer e refazer prioridades, não do dia e da semana, mas do trabalho e da vida. Noutros há que avaliar se o modelo de negócio é o mais adequado.
Carlos Oliveira
No mundo hipercompetitivo e de hipercomunicação em que vivemos é muito fácil quem está em posições de liderança ficar sobrecarregado de trabalho. Estamos constantemente conectados, o que estende a sobrecarga para o espaço que num passado recente era pessoal e familiar. Se a pessoa em causa for um workaholic isso acontece com maior facilidade. Eu sempre fui workaholic. Gosto de trabalhar, não vejo nisso um problema. Exceto quando começa a afetar a saúde, a família e a própria empresa ou local de trabalho.
Várias vezes me vejo em situações de sobrecarga de trabalho, “overworked” na expressão inglesa, que é mais explícita. Já tentei várias soluções – muitas vêm nos cursos e manuais de formação e na internet. Por experiência própria, sinto que muitas delas são superficiais e não endereçam a essência da questão. O resultado tende a ser como aquelas dietas que funcionam durante uns tempos e depois descambam numa situação ainda pior relativa ao ponto de partida.
A disciplina e gestão pessoal ajudam, mas...
É verdade que maior disciplina pessoal ajuda. Ações como planear e fazer a agenda no início de cada dia ou semana, definir uma lista de tarefas, definir prioridades, gerir interrupções, gerir reuniões, entre outras, são importantes.
Entre estas ações corretivas mais superficiais e de comportamento pessoal, a que mais me tem ajudado é não preencher totalmente a agenda da semana. Uma agenda preenchida faz com que cada pequena coisa nova que surja resulte numa sobrecarga imensa e atrasos em tudo o resto, pois não há hipótese de recuperar.
As ações de orçamentação do tempo também são importantes: redefinir o âmbito do trabalho, alocar um tempo preciso e regular a certo tipo de tarefas, adotar a regra 80/20, etc..
Apostar na transformação
No entanto, sinto que a verdadeira gestão da sobrecarga só se consegue quando se endereçam as suas causas fundamentais e se tomam medidas mais profundas e que não são passíveis de implementar num só dia. Muitas delas são um processo de mudança e de transformação.
Em alguns casos as pessoas têm de se perguntar se vale a pena tudo o que estão a fazer e refazer as suas prioridades, não do dia e da semana, mas dos seus trabalhos e das suas vidas. Noutros casos devem avaliar se o modelo de negócio é o mais adequado. Não se muda um modelo de negócio de um momento para o outro, e as ações comportamentais de disciplina pessoal não vão solucionar um problema estrutural. Por isso, por mais complexo que seja o problema estrutural, quanto mais depressa começar a ser endereçado mais rapidamente será melhorado ou solucionado.
Outra solução estrutural tem a ver com a qualidade das pessoas e a gestão das pessoas. Não vale a pena meter-se em desafios para os quais não tenha as pessoas com as competências adequadas. Vai tudo cair-lhe em cima. Ou resolve este problema, ou nenhuma ação de disciplina pessoal lhe vai resolver a sobrecarga de trabalho.
Por último, delegar é fundamental e nem sempre os workaholics o conseguem fazer. Adicionalmente, por vezes é preciso criar as condições para a delegação e noutras vezes é preciso ir para além da delegação e passar a responsabilidade para quem já está em condições de a assumir, muitas vezes melhor que nós.
Quando tiver uma grande sobrecarga, pense que a responsabilidade é essencialmente sua. Evite ficar-se pelas soluções superficiais. Identifique as causas estruturais e enderece-as. Não se limite a soluções imediatas. Aposte num processo de transformação.
A solução passa também por uma questão de atitude em relação a nós próprios – encare os seus limites. Não se pode ser perfeito, fazer tudo e de uma só vez. De outra forma, a sobrecarga vai continuar ou reemergir quando menos espera.
26-07-2016
Carlos Miguel Valleré Oliveira é CEO da LBC, empresa internacional de consultoria de gestão presente em países como a África do Sul, Angola, Brasil, Cabo Verde, EUA, Espanha, Moçambique e Portugal. O antigo presidente da CCILSA – Câmara de Comércio e Indústria Luso Sul-Africana assina a rubrica "Ponto de Vista" no Portal da Liderança sobre os temas da liderança-gestão, economia-sociedade e inovação-empreendedorismo.